sábado, 10 de agosto de 2013

Evolução de proteínas III: o papel da duplicação e da evolução neutra

Ultimamente têm sido conduzidos trabalhos de investigação sobre a origem da complexidade e função proteica.
Em 2011 foi publicado um artigo na revista Nature sobre a evolução das estruturas da ATPase de células de fungos. Um dos líderes da investigação é Joseph W. Thornton, da Universidade de Oregon (autor de um óptimo artigo sobre o qual já falei aqui no blog, também sobre evolução de proteínas – Evolução de proteínas II). Nos fungos (Agaricus bisporus), as células têm que mover os átomos de um lugar para outro. Uma das maneiras de fazer isso é com bombas moleculares, os complexos ATPase vacuolar. Um anel de proteínas lança átomos de um lado de uma membrana no fungo para o outro. Este anel é claramente uma estrutura complexa. Ele contém seis moléculas de proteína: Quatro das moléculas consistem da proteína Vma3, quinto é a Vma11 e o sexto a Vma16. Todos os três tipos de proteínas são essenciais para o anel de girar.
Para saber como essa estrutura complexa evoluiu, os cientistas compararam as proteínas relacionadas noutros organismos, como animais (fungos e animais compartilham um ancestral comum que viveu há cerca de um bilião de anos).
Nos animais, os complexos de ATPase vacuolar também têm anéis feitos de seis proteínas. Mas esses anéis são diferentes dos anéis dos animais: em vez de ter os três tipos de proteínas nos seus anéis, têm apenas duas. Cada anel da proteína animal é constituído por cinco cópias de Vma3 e uma de Vma16. Os fungos são mais complexos do que os animais, pelo menos quando se trata de seus complexos ATPase vacuolar.
Os investigadores olharam atentamente para os genes codificantes responsáveis pelas proteínas do anel. A Vma11, a proteína exclusiva dos fungos, acaba por ser um parente próximo da Vma3 em animais e fungos. Os genes para Vma3 e Vma11 devem, portanto, compartilhar um ancestral comum. A equipe de Thornton concluiu que no início da evolução dos fungos, um gene ancestral das proteínas do anel foi acidentalmente duplicado. Dessas duas cópias, uma evoluiu para Vma3 e outra para Vma11.
Ao comparar as diferenças entre os genes para Vma3 e Vma11, os cientistas reconstituíram o gene ancestral do qual ambas as proteínas (Vma3 e Vma11) evoluíram. Depois usaram a sequência de DNA em causa para criar uma proteína, reconstituindo uma proteína de 800 milhões de anos de idade. Thornton e a sua equipa chamaram a esta proteína Anc.3-11. Então, os cientistas quiseram saber como o anel de proteína funcionava com esta proteína. Para descobrir, inseriram o gene para a Anc.3-11 no DNA duma levedura. Eles também “desligaram” os seus genes descendentes (Vma3 e Vma11), o que numa situação normal seria letal. No entanto foi descoberto que as leveduras poderiam sobreviver com Anc.3-11 a substituí-los, com anéis totalmente funcionais.
Então: os fungos começaram com anéis feitos de apenas duas proteínas - as mesmas encontradas nos animais (como nós, humanos). As proteínas eram versáteis, capazes de se ligar a si ou aos seus parceiros, juntando-se a proteínas ou à sua direita ou à sua esquerda. Mais tarde, o gene para a Anc.3-11 foi duplicado, originando-se a Vma3 e a Vma11. Estas novas proteínas continuaram a fazer o que as antigas faziam. Mas ao longo de milhões de gerações de fungos, começaram a sofrer mutações. Algumas dessas mutações reduziram a sua versatilidade. A Vma11, perdeu a capacidade de se ligar a Vma3 do seu lado dos ponteiros do relógio. A Vma3 perdeu a capacidade de se ligar à Vma16 do seu lado dos ponteiros do relógio. Estas mutações não mataram o fungo, porque as proteínas ainda poderiam unir num anel, sendo consideradas mutações neutras. Mas agora o anel só se pode formar com êxito, apenas se todas as três proteínas estiverem presentes.
Resumindo: com o tempo, evoluíram mais partes e, em seguida, as partes adicionais começaram a divergir uma da outra. Os fungos acabaram com uma estrutura mais complexa do que a dos seus antepassados.

Outro exemplo de evolução neutra construtiva é a edição de RNA. Um cenário proposto é o seguinte: uma enzima sofre mutações, podendo mudar certos nucleótidos do RNA. Esta enzima não prejudica a célula, nem a ajuda, pelo menos não no início, persistindo. Mais tarde ocorre uma mutação prejudicial num gene. Felizmente, a célula já tem a enzima de ligação ao RNA, o que pode compensar essa mutação editando o RNA. Ele protege a célula dos danos da mutação, permitindo a esta passar para a próxima geração e disseminar-se pela população. A evolução desta enzima de edição de RNA e a mutação que se fixou nada teve a ver com a selecção natural e uma vez que se apoderou da população, já não se puderam livrar dela.

Referências:


- http://pages.uoregon.edu/joet/PDF/finnigan-thornton_nature2012.pdf

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