quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Síntese Evolutiva Estendida: Herança não Genética


A primeira teoria evolucionista pela qual me interessei não foi a teoria evolução proposta inicialmente por Charles Darwin, mas sim a proposta por Lamarck e com ela a teoria dos caracteres adquiridos aparentemente já refutada. Certo dia, o professor de biologia informou a turma que íamos assistir a um debate em certa data sobre Evolução vs Criação. Eu já conhecia superficialmente a teoria da herança de caracteres adquiridos e a da selecção natural. Eu achava que elas se completavam e que a teoria de Lamarck poderia ajudar a explicar muitas mudanças, mas o professor discordava – para ele a teoria de Lamarck ao contrário da selecção natural não tinha qualquer base científica actualmente. Ainda assim eu continuava a insistir… e afinal tinha razão! (e Lamarck também).

 De acordo com vários estudos apresentados na primeira obra relativa á síntese estendida (elaborada em 2009), existem variações passíveis de serem herdadas que são independentes de variações na sequencia de DNA. No entanto estas podem guiar a evolução genética. A herança soft (não genética) é a herança de variações induzidas e reguladas durante o desenvolvimento. Esta envolve modificações do DNA e outras na regulação da expressão genética.  Estas mudanças podem levar a ‘saltos’ evolutivos. Além disso variações num numero reduzido de genes podem ter efeitos fenotípicos em larga escala – o que nos remete para a sua influencia na macro-evolução.

A rede de interacções do desenvolvimento é o foco da selecção (e não o gene).

David Nanney (1958) descreveu sistemas de controlo epigenético e reconheceu que diferenças entre células nem sempre dependem do material genético primitivo descreveu como sistemas induzidos no núcleo e fora podem trazer diferenças passíveis de serem herdadas.

As células da linha germinativa podem ser afectadas pelas mudanças epigenéticas.


Os mecanismos pelos quais ocorre a variação epigenética devem ser apresentados sumariamente:


CIRCUITOS METABÒLICOS AUTO-SUSTENTÀVEIS

A actividade dos genes pode ser mantida por mecanismos de regulação genética nos quais eles próprios participam (interacções DNA-proteína). Se os componentes do circuito forem transmitidos ás células-filhas após a divisão, os mesmos padrões de actividade genética podem ser reconstruídos. Como exemplo: o facto de um fungo ter 2 cores passíveis de serem transmitidas requer determinados níveis de proteína reguladora.



TEMPERAMENTO ESTRUTURAL

Proteínas podem adquirir conformações tridimensionais alternativas que podem influenciar outras (mecanismo ainda não se encontra compreendido)


MARCAÇÂO DA CROMATINA

Marcações da cromatina resultam de modificações / acrescento de pequenos grupos químicos que estão covalentemente ligados ao DNA (ocorrendo também modificações em histonas e outras proteínas. Todo o processo está relacionado com a expressão genética. O sistema mais bem compreendido é a metilação. Relativamente á metilação nas bactérias, a metilação da citosina ou da adenina é parte do sistema defensivo de modificações de restrição em várias espécies, no qual certas sequencias de DNA são periodicamente metiladas ao longo do genoma. A metilase é a enzima que reconhece (por reconhecer entenda-se capacidade diferencial de ligação a uma certa sequencia de DNA conforme a sua composição e estrutura) uma determinada sequencia uma das bases na sequencia ou próxima. Este sistema de metilação teria evoluído por conferir vantagem na protecção do organismo contra DNA exógeno.  

A metiltransferase DNA-adenina (Dam) é uma enzima que não pertence a esse sistema. A sequencia de reconhecimento é GATC. A metilação ou a sua ausência é um marcador que permite a diferenciação entre uma cadeia e outra durante a replicação pelo sistema molecular de reparação. A expressão de certos genes é regulada pela metilação na região promotora. As condições ambientais da célula após a replicação determinam a região a ser metilada pela Dam – assim o ambiente pode influenciar a expressão genética. A partir deste sistema evoluiu a enzima dos mamíferos via fusão de uma sequencia codificante de uma enzima procariótica com um gene de função desconhecida. As semelhanças sequenciais sugerem uma origem comum. Nos eucariotas as bases metiladas são normalmente as citosinas (o que aumenta a possibilidade de mutação pontual, uma vez que esta pode oiginar timina). Há evidencias de que algumas modificações são transmitidas á descendência celular (Manning e tal, 2006).         


HERANÇA MEDIADA POR RNA


EVIDENCIAS

Num estudo recente foram evidenciados mais de cem casos de herança epigenética em 42 espécies. A herança epigenética ocorre conforme o demonstrado.


A INFLUENCIA DA MORFOLOGIA MATERNA NO DESENVOLVIMENTO


O tamanho do útero está fortemente correlacionado com o tamanho da criança.


TRANSMISSÃO ATRAVÈS DE PRODUTOS BIOLÒGICOS

Em mamíferos, ‘conhecimento’ imunológico pode ser transmitido através da amamentação e da placenta para a descendência, visto que os anticorpos transmitidos podem guiar a maturação do sistema imunitário. Nem sempre este sistema de transmissão é benéfico, pois também podem ser transmitidas doenças provocadas por priões.


ADAPTAÇÃO

A adaptação pode ocorrer através da selecção das variações epigeneticas hereditárias, o que pode ser importante em populações com variabilidade genética reduzida. A observação da variação epigenética nas populações naturais reforça a ideia (Bossdorf e tal, 2008). A dinâmica das mudanças evolutivas através das variações epigenéticas herdadas é provavelmente diferente da que se assume nos modelos convencionais de genética populacional pois estes assumem as mutações como eventos raros, enquanto que o mesmo não se verifica relativamente ás variações epigenéticas (epimutações).

Apesar desta pretensão, as mutações potencialmente benéficas são amplamente verificadas em vírus e bacterias que desenvolvem resistência a antibióticos e anti-virais.

Como exemplo de mutação viral face a um antiviral é de mencionar a modificação sofrida pelo vírus H1N1, acompanhada pelos profissionais de saúde e estudada.

É sugerido que modificações epigenéticas em regiões não-codificantes se espalharam pelo genoma e afectaram a expressão de muitos genes, o que explica o aparecimento de mudanças físicas em larga escala. A selecção e a epimutação podem não ser independentes: estas podem ser induzidas pelo ambiente selectivo e por vezes podem ser revertidas face a mudanças de condições. Deste modo as modificações epigenéticas podem acelerar o processo evolutivo.         


MACROEVOLUÇÃO

O controlo epigenético de certos mecanismos genéticos pode provocar mudanças em larga escala – por exemplo, o controlo da expressão de um gene homeobox, cujas alterações produzem modificações anatómicas em larga escala.

Rearranjos genómicos regulados são encontrados em eucariontes muito diferentes, o que sugere a antiguidade destes mecanismos. Alguns destes mecanismos – marcação de cromatina e controlo baseado em RNA nalguns casos contribuem para a sobrevivência de um hospedeiro a uma invasão por material exógeno silenciando estes genes. A regulação epigenética teria trazido vantagem perante certas modificações como duplicações que levaram á expansão do genoma, de modo a propiciar melhor organização do genoma expandido. Estes mecanismos teriam também tido importância no aparecimento dos seres multicelulares, nomeadamente no processo de diferenciação celular, permitindo a existência de organismos com células, tecidos e órgãos tão bem diferenciados como nos humanos. Cientistas que desenvolveram estudos na área da ‘Evo-Devo’ afirmaram que as variações em genes deveriam ser consideradas ‘inputs’ para redes ou unidades de desenvolvimento, mas que o genoma deveria também ser visto como um sistema em desenvolvimento com os seus próprio mecanismos induzidos.    



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