A primeira teoria evolucionista pela qual me interessei não
foi a teoria evolução proposta inicialmente por Charles Darwin, mas sim a
proposta por Lamarck e com ela a teoria dos caracteres adquiridos aparentemente
já refutada. Certo dia, o professor de biologia informou a turma que íamos
assistir a um debate em certa data sobre Evolução vs Criação. Eu já conhecia
superficialmente a teoria da herança de caracteres adquiridos e a da selecção
natural. Eu achava que elas se completavam e que a teoria de Lamarck poderia
ajudar a explicar muitas mudanças, mas o professor discordava – para ele a
teoria de Lamarck ao contrário da selecção natural não tinha qualquer base científica
actualmente. Ainda assim eu continuava a insistir… e afinal tinha razão! (e
Lamarck também).
De acordo com vários
estudos apresentados na primeira obra relativa á síntese estendida (elaborada
em 2009), existem variações passíveis de serem herdadas que são independentes
de variações na sequencia de DNA. No entanto estas podem guiar a evolução
genética. A herança soft (não genética) é a herança de variações induzidas e
reguladas durante o desenvolvimento. Esta envolve modificações do DNA e outras
na regulação da expressão genética. Estas
mudanças podem levar a ‘saltos’ evolutivos. Além disso variações num numero
reduzido de genes podem ter efeitos fenotípicos em larga escala – o que nos
remete para a sua influencia na macro-evolução.
A rede de interacções do desenvolvimento é o foco da
selecção (e não o gene).
David Nanney (1958) descreveu sistemas de controlo
epigenético e reconheceu que diferenças entre células nem sempre dependem do
material genético primitivo descreveu como sistemas induzidos no núcleo e fora
podem trazer diferenças passíveis de serem herdadas.
As células da linha germinativa podem ser afectadas pelas
mudanças epigenéticas.
Os mecanismos pelos quais ocorre a variação epigenética
devem ser apresentados sumariamente:
CIRCUITOS METABÒLICOS AUTO-SUSTENTÀVEIS
A actividade dos genes pode ser mantida por mecanismos de
regulação genética nos quais eles próprios participam (interacções
DNA-proteína). Se os componentes do circuito forem transmitidos ás
células-filhas após a divisão, os mesmos padrões de actividade genética podem
ser reconstruídos. Como exemplo: o facto de um fungo ter 2 cores passíveis de
serem transmitidas requer determinados níveis de proteína reguladora.
TEMPERAMENTO ESTRUTURAL
Proteínas podem adquirir conformações tridimensionais
alternativas que podem influenciar outras (mecanismo ainda não se encontra
compreendido)
MARCAÇÂO DA CROMATINA
Marcações da cromatina resultam de modificações / acrescento
de pequenos grupos químicos que estão covalentemente ligados ao DNA (ocorrendo
também modificações em histonas e outras proteínas. Todo o processo está relacionado
com a expressão genética. O sistema mais bem compreendido é a metilação.
Relativamente á metilação nas bactérias, a metilação da citosina ou da adenina
é parte do sistema defensivo de modificações de restrição em várias espécies,
no qual certas sequencias de DNA são periodicamente metiladas ao longo do
genoma. A metilase é a enzima que reconhece (por reconhecer entenda-se
capacidade diferencial de ligação a uma certa sequencia de DNA conforme a sua
composição e estrutura)
uma determinada sequencia uma das bases na sequencia ou próxima. Este sistema
de metilação teria evoluído por conferir vantagem na protecção do organismo
contra DNA exógeno.
A metiltransferase DNA-adenina (Dam) é uma enzima que não
pertence a esse sistema. A sequencia de reconhecimento é GATC. A metilação ou a
sua ausência é um marcador que permite a diferenciação entre uma cadeia e outra
durante a replicação pelo sistema molecular de reparação. A expressão de certos
genes é regulada pela metilação na região promotora. As condições ambientais da
célula após a replicação determinam a região a ser metilada pela Dam – assim o
ambiente pode influenciar a expressão genética. A partir deste sistema evoluiu
a enzima dos mamíferos via fusão de uma sequencia codificante de uma enzima procariótica
com um gene de função desconhecida. As semelhanças sequenciais sugerem uma
origem comum. Nos eucariotas as bases metiladas são normalmente as citosinas (o
que aumenta a possibilidade de mutação pontual, uma vez que esta pode oiginar
timina). Há evidencias de que algumas modificações são transmitidas á
descendência celular (Manning e tal, 2006).
HERANÇA MEDIADA POR RNA
EVIDENCIAS
Num estudo recente foram evidenciados mais de cem casos de
herança epigenética em 42 espécies. A herança epigenética ocorre conforme o
demonstrado.
A INFLUENCIA DA MORFOLOGIA MATERNA NO DESENVOLVIMENTO
O tamanho do útero está fortemente correlacionado com o
tamanho da criança.
TRANSMISSÃO ATRAVÈS DE PRODUTOS BIOLÒGICOS
Em mamíferos, ‘conhecimento’ imunológico pode ser
transmitido através da amamentação e da placenta para a descendência, visto que
os anticorpos transmitidos podem guiar a maturação do sistema imunitário. Nem
sempre este sistema de transmissão é benéfico, pois também podem ser
transmitidas doenças provocadas por priões.
ADAPTAÇÃO
A adaptação pode ocorrer através da selecção das variações
epigeneticas hereditárias, o que pode ser importante em populações com
variabilidade genética reduzida. A observação da variação epigenética nas
populações naturais reforça a ideia (Bossdorf e tal, 2008). A dinâmica das
mudanças evolutivas através das variações epigenéticas herdadas é provavelmente
diferente da que se assume nos modelos convencionais de genética populacional pois
estes assumem as mutações como eventos raros, enquanto que o mesmo não se
verifica relativamente ás variações epigenéticas (epimutações).
Apesar desta pretensão, as mutações potencialmente benéficas
são amplamente verificadas em vírus e bacterias que desenvolvem resistência a
antibióticos e anti-virais.
Como exemplo de mutação viral face a um antiviral é de
mencionar a modificação sofrida pelo vírus H1N1, acompanhada pelos
profissionais de saúde e estudada.
É sugerido que modificações epigenéticas em regiões
não-codificantes se espalharam pelo genoma e afectaram a expressão de muitos
genes, o que explica o aparecimento de mudanças físicas em larga escala. A
selecção e a epimutação podem não ser independentes: estas podem ser induzidas
pelo ambiente selectivo e por vezes podem ser revertidas face a mudanças de
condições. Deste modo as modificações epigenéticas podem acelerar o processo
evolutivo.
MACROEVOLUÇÃO
O controlo epigenético de certos mecanismos genéticos pode
provocar mudanças em larga escala – por exemplo, o controlo da expressão de um
gene homeobox, cujas alterações produzem modificações anatómicas em larga
escala.
Rearranjos genómicos regulados são encontrados em
eucariontes muito diferentes, o que sugere a antiguidade destes mecanismos.
Alguns destes mecanismos – marcação de cromatina e controlo baseado em RNA
nalguns casos contribuem para a sobrevivência de um hospedeiro a uma invasão
por material exógeno silenciando estes genes. A regulação epigenética teria
trazido vantagem perante certas modificações como duplicações que levaram á
expansão do genoma, de modo a propiciar melhor organização do genoma expandido.
Estes mecanismos teriam também tido importância no aparecimento dos seres
multicelulares, nomeadamente no processo de diferenciação celular, permitindo a
existência de organismos com células, tecidos e órgãos tão bem diferenciados
como nos humanos. Cientistas que desenvolveram estudos na área da ‘Evo-Devo’ afirmaram
que as variações em genes deveriam ser consideradas ‘inputs’ para redes ou
unidades de desenvolvimento, mas que o genoma deveria também ser visto como um
sistema em desenvolvimento com os seus próprio mecanismos induzidos.
Sem comentários:
Enviar um comentário