Os amigos imaginários podem-se englobar no realismo (do
pensamento mágico) e normalmente são o produto de insegurança por parte da
criança, criados por necessidade constituindo por isso um caso particular.
Provavelmente a origem dos deuses e da religião é
proveniente da necessidade de explicar fenómenos naturais. É diferente do caso
dos amigos imaginários. Poderia ser derivada de um fenómeno semelhante ao
fenómeno do artificialismo no desenvolvimento cognitivo da criança – ex.: o
Sol, existe porque foi acendido por um fósforo gigante*. No entanto podem
considerar-se algumas semelhanças se considerarmos que os deuses são também uma
forma de conforto quando alguém morre – ‘Está com deus’ ou perante a solidão.
A origem da religião na vida de uma pessoa actualmente é
explicada facilmente pela teoria dos memes (Dawkins Richard, 1976): existe uma
espécie de ‘hereditariedade’ – as ideias, as concepções culturais passam de
geração em geração através dos pais e não só – de todos os que nos são próximos
durante o desenvolvimento – professores, catequistas, amigos (sub-entenda-se
pais dos amigos). No entanto estas são modificadas cruzando informação e
raciocinando sobre o assunto, permitindo que as concepções evoluam em cada
indivíduo, sem ser possível excluir a influência ‘hereditária’ das concepções
religiosas individuais (quando me refiro a concepções religiosas incluo o
ateísmo e o agnosticismo, apesar destes representarem a ausência de crença
religiosa). Deste modo, a origem da religião nos dias actuais não está
notavelmente relacionada com fenómenos semelhantes aos que associamos a
crianças no estádio pré-operatório (classificação de Piaget). Mas quanto á sua
origem ‘inicial’, podemos afirmar que começaram por tomar como deuses o que
observavam na natureza, incluindo o ‘equilíbrio’ entre sexos opostos e a
capacidade humana de gerar vida – ilustrado pelas estátuas de mulheres grávidas
designadas ‘Vénus’. Esta situação teria evoluído para uma necessidade de
explicação das origens e ocorrências de elementos e fenómenos naturais através
de seres inteligentes, semelhantes ao ser humano, mas mais poderosos – o
artificialismo, na medida em que se atribui á génese de fenómenos naturais uma
intervenção humana. Se atentarmos ainda no facto do conforto que a religião
traz perante a morte e a solidão podemos estar perante um fenómeno semelhante á
criação de amigos imaginários, na medida em que foi a necessidade de conforto
que contribuiu para a génese do pensamento religioso e dos deuses como hoje os
concebemos. A ideia de que quem está morto está com um deus de amor traz
bastante conforto, bem como a ideia de que não estamos sós neste Universo
Este conforto proporcionado pela religião pode estar
relacionado com as escolhas religiosas individuais (e penso que esta é a chave
do sucesso evolutivo da religião), no entanto, ao contrário do que acontece com
os amigos imaginários, actualmente as pessoas não criam deuses – estes já foram
criados pelos seus ancestrais.
Se as pessoas religiosas se apercebessem da origem das suas
próprias concepções provavelmente não seriam religiosas.
Discuti um pouco este assunto com a minha professora de
Psicologia do Desenvolvimento e ela discordou com a teoria dos amigos
imaginários, mas concordou sobre o artificialismo relativamente ás origens.
Penso que ela discordou com a parte do amigo imaginário porque eu não utilizei
na aula a explicação da necessidade de conforto perante a morte e a solidão,
que é a única coisa capaz de relacionar um fenómeno com o outro – a aparência
comportamental de quem reza a um deus inexistente que referi não chega e eu
tenho consciência, é como ter homologia apenas nas propriedades químicas de
aminoácidos, que não é o suficiente para inferir ancestralidade comum (pode ser
o resultado de evolução convergente).
*O exemplo corresponde a uma situação real.
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