quarta-feira, 24 de outubro de 2012

A Religião e os Amigos Imaginários


Os amigos imaginários podem-se englobar no realismo (do pensamento mágico) e normalmente são o produto de insegurança por parte da criança, criados por necessidade constituindo por isso um caso particular.

Provavelmente a origem dos deuses e da religião é proveniente da necessidade de explicar fenómenos naturais. É diferente do caso dos amigos imaginários. Poderia ser derivada de um fenómeno semelhante ao fenómeno do artificialismo no desenvolvimento cognitivo da criança – ex.: o Sol, existe porque foi acendido por um fósforo gigante*. No entanto podem considerar-se algumas semelhanças se considerarmos que os deuses são também uma forma de conforto quando alguém morre – ‘Está com deus’ ou perante a solidão.

A origem da religião na vida de uma pessoa actualmente é explicada facilmente pela teoria dos memes (Dawkins Richard, 1976): existe uma espécie de ‘hereditariedade’ – as ideias, as concepções culturais passam de geração em geração através dos pais e não só – de todos os que nos são próximos durante o desenvolvimento – professores, catequistas, amigos (sub-entenda-se pais dos amigos). No entanto estas são modificadas cruzando informação e raciocinando sobre o assunto, permitindo que as concepções evoluam em cada indivíduo, sem ser possível excluir a influência ‘hereditária’ das concepções religiosas individuais (quando me refiro a concepções religiosas incluo o ateísmo e o agnosticismo, apesar destes representarem a ausência de crença religiosa). Deste modo, a origem da religião nos dias actuais não está notavelmente relacionada com fenómenos semelhantes aos que associamos a crianças no estádio pré-operatório (classificação de Piaget). Mas quanto á sua origem ‘inicial’, podemos afirmar que começaram por tomar como deuses o que observavam na natureza, incluindo o ‘equilíbrio’ entre sexos opostos e a capacidade humana de gerar vida – ilustrado pelas estátuas de mulheres grávidas designadas ‘Vénus’. Esta situação teria evoluído para uma necessidade de explicação das origens e ocorrências de elementos e fenómenos naturais através de seres inteligentes, semelhantes ao ser humano, mas mais poderosos – o artificialismo, na medida em que se atribui á génese de fenómenos naturais uma intervenção humana. Se atentarmos ainda no facto do conforto que a religião traz perante a morte e a solidão podemos estar perante um fenómeno semelhante á criação de amigos imaginários, na medida em que foi a necessidade de conforto que contribuiu para a génese do pensamento religioso e dos deuses como hoje os concebemos. A ideia de que quem está morto está com um deus de amor traz bastante conforto, bem como a ideia de que não estamos sós neste Universo
Este conforto proporcionado pela religião pode estar relacionado com as escolhas religiosas individuais (e penso que esta é a chave do sucesso evolutivo da religião), no entanto, ao contrário do que acontece com os amigos imaginários, actualmente as pessoas não criam deuses – estes já foram criados pelos seus ancestrais.  

Se as pessoas religiosas se apercebessem da origem das suas próprias concepções provavelmente não seriam religiosas.

Discuti um pouco este assunto com a minha professora de Psicologia do Desenvolvimento e ela discordou com a teoria dos amigos imaginários, mas concordou sobre o artificialismo relativamente ás origens. Penso que ela discordou com a parte do amigo imaginário porque eu não utilizei na aula a explicação da necessidade de conforto perante a morte e a solidão, que é a única coisa capaz de relacionar um fenómeno com o outro – a aparência comportamental de quem reza a um deus inexistente que referi não chega e eu tenho consciência, é como ter homologia apenas nas propriedades químicas de aminoácidos, que não é o suficiente para inferir ancestralidade comum (pode ser o resultado de evolução convergente).

 

*O exemplo corresponde a uma situação real.         

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